domingo, 13 de fevereiro de 2011

A Síndrome de Sergio Mallandro do Design

A algum tempo, vi na TV uma entrevista com o Sergio Mallandro, no qual foi indagado sobre uma história em que ele fora junto com o guitarrista Pepeu Gomes impedido de entrar no recinto de um dos parques da Disney por estarem com vestes coloridas demais. Sergio Mallandro confirmou a história, dizendo que a primeira ida dele e do guitarrista à Disney fora uma aventura e tanto até a entrada do parque, no qual os dois estavam extremamente e espalhafatosamente vestidos coloridos demais e o segurança rindo da cara deles disse que eles iam aparecer mais que as atrações do parque, os impediu de entrar.

Inicio este post com esta história, enganchando-a em um caso que vi a pouco tempo, um amigo recém formado em design que abriu uma agência, esta era tão colorida quanto o humorista e o guitarrista do começo da história.
As paredes amarelas, azuis, com padrões esquistos, uma entrada estranha em cores berrantes, cadeiras jogadas a esmo sem precisão alguma, livros e mais livros que no quais nunca foram lidos dispostos em todos os lugares afim de passar uma falsa impressão de intelectualidade.
Agora imagine um industrial, na casa de seus 50 anos, um cliente em potencial que tem realmente dinheiro pra gastar em um trabalho de design qualquer entrando em um lugar destes, e se deparando com este ambiente junto claro, com um sujeito de chinelos, cabelo gigantesco falando em gírias.

Pois bem, aí que está, o design está colorido demais em priori, no atendimento ao cliente.
Este é o interior da maior agência de publicidade do Brasil, a Young & Rubicam e seu presidente Marcelo Quintela, a sobriedade não é a toa. Vê algum papel de parede colorido? Algum elemento exageradamente fora do comum? Pessoas com cabelos estranhos ou com atitudes esquisitas?

Não me esqueço quando trabalhei em uma grande agência de publicidade no interior de São Paulo, naquela época eu havia acabado de sair da faculdade, eu tinha esta mentalidade de que agência de design tinha que ser um ambiente tão quão colorido quanto os trabalhos. Ledo engano, quando coloquei o pé dentro da recepção de tal agência, me deparei com uma sala com uma secretária, o ambiente sóbrio, com peças em pequenos quadros salpicavam uma parede negra, os móveis bem arranjados e colocados de forma disposta a criar um ambiente simples, mas muito sofisticado.
Fui recebido pelo meu futuro patrão, eu com uma camiseta destas de estampas descoladas hippister fui praticamente subtraído daquele ambiente, parecia que eu não pertencia aquele lugar, o homem que me recebeu usava uma camisa engomada, sapatos e cabelos penteados e com um sorriso no rosto, apertou minha mão com força e me levou até uma sala de reuniões, esta com uma mesa de tampo negro que parecia subir até o teto ao tomar caminho pela pintura que subia também em cor escura na parede ao lado dela, cadeiras dispostas ao redor, uma grande LCD que naquela época era coisa rara ainda, ao lado uma estante de mogno também negra exibia livros no qual eu mal conseguia ler as lombadas a não ser dos mais grossos, um ao lado do outro alinhados como teclas de piano.
Conversamos por quase dez minutos, minhas gírias eram canceladas pelo bom português do homem, sem sotaque e com um agradável senso de humor e uma educação invejável, eu me senti péssimo naquele momento, parecia que jamais iria conseguir emprego em um local tão sofisticado, dias depois lá estava eu trabalhando, mas depois de diversas recomendações de vestimentas que acatei sem delongas, lá estava eu atendendo a clientes com uma camisa, coisa que usava até então raramente e cabelos penteados no qual mal me lembrava a última vez que fizera.

Minha sensação no dia daquela primeira conversa foi como a do Sergio Mallandro na entrada da Disney, eu estava subtraído daquele lugar, eu poderia com certeza pensar como a maior parte dos designers que se auto-afirmam visualmente, "mas este é meu estilo", mas me coloquei como aquele industrial que inventei acima, com certeza a sobriedade passada por esta agência faria o fechar negócio ali mesmo, naquele lugar, com certeza as chances daquele industrial de 50 e poucos anos abrir uma conta naquela agência eram bem maiores que na agência Sergio Mallandro do rapaz recém formado.
Interior da agencia de publicidade JWT, uma das maiores do Brasil, um estilo diferenciado, mas ainda bebe de conceitos visuais corporativos afim de criar um choque de ambientes, que passa modernidade e sobriedade.

Percebi então que a palavra criativo como adjetivo para abranger um ambiente de trabalho no qual seu cliente põe o pé deve ser muito bem separada do atendimento da parte de criação. Este patrão uma vez me falou o seguinte, que a agência, o ambiente, as pessoas jamais deveriam extrapolar os elementos que as peças que a agência produzira, era mais ou menos como um quadro no qual a moldura não deveria chamar mais a atenção que a obra em si, claro, grande parte dos clientes eram em uma faixa de idade entre 30 a 50 anos, estes são aqueles que tem dinheiro pra gastar, pra investir na agência. Um cliente destes se sente bem em um lugar sóbrio, mas não se sente bem em um ambiente colorido demais, difícil de digerir.

Designers recém formados que gostam de encher o peito e dizer que são projetistas para diversos nichos, parecem não projetam suas agências ao seu público, a porta de entrada para o ganha pão é um verdadeiro Sergio Mallandro, que para aquele jovem designer agrada, mas para o senhorzinho dono de empresa séria não. A agência no seu interior deve ser um ambiente corporativo visualmente, um dos maiores erros é a bagunça, cores demais e o conceito de "largado"elevado a décima potência que aflora na decoração das novas agências. E estes elementos jogados passam a idéia de um ambiente no qual os próprios donos não conseguem arrumar o que está adiante da distância de um braço, e pudera, será mesmo que um cliente vai dar a imagem da sua empresa para uma pessoa que joga livros numa estante sem o mínimo cuidado? Temos cuidado pra projetar uma grid, mas não conseguimos projetar a disposição de livros em uma estante.
Sites de agências de design parecem concorrer em uma corrida entre quem ganha é o mais lotado de elementos inúteis, acima o contrário, o site da Duarte Design simplesmente a responsável pelo famoso keynote do ex vice presidente dos EUA Al Gore sobre o aquecimento global.

Designers não tem posicionamento para agir com clientela mas se colocam nesta condição ainda mais quando formam em seus cursos já que o pouco dinheiro impede a contratação de um atendimento, por isso o cuidado e atenção nas ações neste momento do novo negócio deve ser delicado e muito bem pensando, sua agência é uma empresa como qualquer outra, porque não agir com ela desta forma ao invés de vesti-la como um Sergio Mallandro e tentar enfia-la goela abaixo dos seus clientes?
O se deve entender é que o seu público é formado por pessoas comuns, de áreas diversas que não entendem de design, claro, senão nem estariam lhe procurando. Um piercing a mostra no Brasil ainda é sinônimo de desmazelo, assim como tatuagens ainda são mal vistas como na época que eram estritamente coisa de presidiário. Infelizmente ainda é assim, por isso grandes agências driblam colocando aquele funcionário mais humano no atendimento, afim de criar um canal direto com o cliente.
Foto feita em um congresso de designers, apesar da casualidade, você entregaria sua marca na mão de uma destas pessoas?

Por isso o visual de um designer cai muito bem no meio da academia, da faculdade, do curso, onde ele está cercado de designers, mas para o mundo Disney, ou o mundo lá fora, ele não é aceito com tanta facilidade, porque eclode o limite do aceitável, então comece a projetar também sua imagem como uma empresa diante do público e não como um ambiente descolado em relação a outros designers como se fosse uma competição em que o vencedor é o mais colorido, vista seu Sergio Mallandro para que ele possa entrar na Disney sem problemas.

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